cancro meu: A arte de viver

Já tinha saudades de escrever aqui no blog! Têm sido meses de muito trabalho e todo o tempo que sobra tem sido ocupado em simplesmente saboreá-lo!!!

Existe um tempo em que o tempo pára, apenas para se deixar ficar, para se deixar gozar, sem medo do que já foi ou do que virá!

Está quase a fazer 2 anos que descobri, num dia ameno como o de hoje, que tinha cancro de mama! Desde aí, o tempo envolveu-se numa nuvem cinzenta, carregada de medo e incerteza, que me acompanhou em muitos momentos.

Sinto que finalmente a nuvem desapareceu... ando por isso super "ocupada"!!!! Ocupada em aproveitar o tempo para saborear a vida, tratar de mim, fazer os balanços necessários à minha evolução, arrumar as ideias, reunir com o meu corpo e mente

Um corpo que não pode mentir, mas que incorporou as marcas de guerra e as acolheu como suas, sem mágoa nem rancor. 

Uma mente que se libertou de qualquer fantasma e segue agora o seu propósito de uma forma livre e renovada!

Esta semana perguntei-me muitas vezes se foram precisos QUASE ou  APENAS 2 anos para me sentir assim? Pareceu muito ou pouco??

Por um lado, parece que foi um segundo de magia, um sonho... E que a minha vida saiu da sua trajetória para ter um devaneio e se permitir viver no fio da navalha durante uns instantes.

Outras, parece que sempre foi assim e que já não me lembro do antes-cancro! Algumas pessoas dizem que eu estou muito diferente...Mas como é que eu era?

Esta nova Inês, renascida de um momento tão trágico, veio para ficar de forma permanente. Todo o processo doeu, marcou, mas já está saudavelmente esquecido.

De tudo isto resta sim a vontade de querer ajudar os outros, de vos acarinhar, de vos fazer acreditar que na altura certa tudo também ficará não só esquecido como fortalecido!

Ontem, deitada sobre a base fria da máquina da TAC, tive a certeza que está tudo bem! Senti muitas vezes necessidade de fazer as pazes comigo, de pedir desculpa ao meu corpo por todo o mal que lhe fiz e que ainda lhe faço - ecografias,  mamografias, cintigrafias, agulhas, apalpadelas, consultas,... Prometi protegê-lo, da mesma forma que fiz com os meus filhos, sem o traumatizar.

Dispo-me para me preparar para a eco abdominal e imagino que vou fazer uma massagem, estico o braço para mais uma picadela e rio-me com a enfermeira ou com a minha mãe que ainda me trata como uma menina!! 

- "utilizem as agulhas mais fininhas, ok?? É que a minha filha tem as veias muito sensíveis!!", diz ela, com um sorriso ternurento.

É esta alma de principiante, este lado "ingénuo" que faz a vida fluir! 

Sem conhecermos aquele frio que dói, nunca daríamos tanto valor aos dias quentes de Verão que nos acariciam a pele. Sem conhecermos os segredos da noite, nunca valorizaríamos aqueles tons reveladores do pôr do sol! 

Sem ter sentido a vida por um fio, nunca chegaria a perceber a verdadeira arte de viver... E por isso agradeço....

Beijo nos vossos corações <3 <3